Um projeto do laboratório de dados e narrativas na Favela da Maré, o data_labe, veio para responder diversas dúvidas sobre o saneamento na região e construir uma verdadeira revolução dos dados. Com apoio do International Programme do Governo Britânico e do Parque Tecnológico da UFRJ, o Cocôzap atua para minimizar impactos da Covid-19 na Maré.
A relação entre as condições de saneamento básico (água e esgoto) e a proliferação do novo coronavírus é estudada há algum tempo. Artigos de revistas científicas atestam a presença do vírus nos excrementos humanos, mesmo em casos assintomáticos ou curados. A parcela da população que não possui água encanada ou rede de esgoto tem mais dificuldades ao combater o contágio, visto que a intensificação da higiene é apontada por especialistas como a melhor estratégia.
Inserido nesse contexto de precariedade no que diz respeito ao saneamento básico, o Cocôzap foi iniciado no fim de 2016 com o objetivo de promover a transformação social a partir de dados gerados por cidadãos. Atualmente o projeto está lançando uma nova etapa em resposta à pandemia de Covid-19.
Momento do projeto
O objetivo da fase atual é usar as tecnologias digitais para desenvolver um plano de monitoramento dos impactos da pandemia no Conjunto de Favelas da Maré, com foco na variável do saneamento básico. A partir deste plano, espera-se construir um conjunto de evidências técnicas e científicas para a produção de políticas públicas e de engajamento cívico por parte de ativistas, jornalistas e população em geral.
“A Maré está localizada no entorno da UFRJ (campus Fundão), e por isso, estabelecer relações com este bairro – que tem mais de 140 mil habitantes – é fundamental. Neste caso, vamos trabalhar com o tema do saneamento, aspecto essencial para o enfrentamento da pandemia de Covid-19. Faremos isso a partir da relação entre áreas acadêmicas, empresas startups e organizações locais”, explicou o gerente de desenvolvimento institucional do Parque, Leonardo Melo.
Do ponto de vista metodológico, será realizado o acompanhamento do impacto do novo coronavírus na vida cotidiana de 15 famílias na Maré, com ênfase na violação de direitos sanitários. A partir disto, serão levantados e cruzados dados públicos e comunitários – como o censo populacional da Maré – sobre a questão urbanística no território, produzindo informação relevante para a tomada de decisão nas diferentes esferas da sociedade. A estratégia utilizada está diretamente relacionada ao conceito de cidades inteligentes (smart cities).
“O governo britânico tem apoiado iniciativas na área de cidades inteligentes em diferentes regiões do Brasil. O objetivo é promover o desenvolvimento sustentável, a redução da pobreza e a melhoria da qualidade de vida nos centros urbanos. Este compromisso se torna ainda mais relevante no contexto atual, onde o uso de dados e a aplicação de tecnologias inteligentes são as principais ferramentas na busca de soluções para os desafios trazidos pela pandemia”, considerou o diretor do programa de cidades inteligentes da embaixada do Reino Unido no Brasil, João Rampini.
Durante os próximos meses, o data_labe vai desenvolver um plano com uma série de recomendações para a diminuição dos impactos da crise sanitária na Maré, visando a criação de propostas que também possam ser aplicadas a outras favelas e territórios populares.
Como funciona o CocôZap
A proposta de “revolução dos dados” do Cocôzap é atravessada pelo engajamento dos moradores nas políticas locais. O funcionamento prático é o seguinte: os moradores que encontram vazamentos de águas residuais não tratadas, lixo não coletado ou falta de acesso à água limpa podem enviar uma mensagem com fotos e/ou vídeos para o contato do Cocôzap.
Cada relato passa a integrar um banco de dados com todas as informações descritivas, o que constrói um mapeamento. Com estes dados estão organizados e mapeados, o laboratório da Maré usa as informações para criar relatórios e apresentações sobre os problemas sanitários e seus impactos sobre os moradores da Maré.
“Acreditamos que assim, de forma colaborativa, horizontal e facilmente replicável, serão construídos diagnósticos mais fidedignos do que os indicadores ditos oficiais, utilizados pelos gestores públicos. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por exemplo, mais de 90% dos domicílios de toda a região metropolitana do Rio de Janeiro são atendido por serviços de coleta de lixo e esgotamento sanitário. Sabemos que isso não é verdade. A ideia de gerar dados a partir de nosso próprio engajamento e vivência pode também indicar soluções mais legítimas, baseadas em evidências fornecidas justamente por quem vive os dados mais extremos”, aponta o coordenador do data_labe Gilberto Vieira, em artigo publicado no Medium.