Fonte: O Globo|
A Agência Nacional do Petróleo (ANP) está em fase final de concluir mudanças nas regras para aplicação de recursos pelas empresas petrolíferas em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação Tecnológica (P,D&I). As mudanças, porém, vêm preocupando empresas e órgãos de pesquisa por serem consideradas forte intervenção estatal. A ANP já realizou duas audiências públicas sobre o assunto, e a resolução com as mudanças deverá sair até o próximo mês.
A principal mudança que preocupa o setor é que, a partir das novas regras, será a ANP que vai decidir que projetos e em quais centros de pesquisas, universidades ou fornecedores deverão ser aplicados esses recursos. Hoje, isso é decidido pelas empresas.
As companhias de petróleo são obrigadas a investir 1% de sua receita anual em P,D&I. No ano passado, isso representou um total de investimentos de R$ 1,4 bilhão.
Metade do valor é aplicado diretamente nos centros tecnológicos das próprias petroleiras. A metade restante é destinada a centros de pesquisa ou universidades escolhidos pelas petrolíferas. No ano passado, isso significou um volume de R$ 700 milhões.
Na avaliação de um empresário que prefere não se identificar, a mudança representará forte intervenção estatal na aplicação dos recursos e afeta a parcela destinada a universidades que até então eram selecionadas pelas empresas. O impacto pode ser ainda maior no Estado do Rio, onde se concentram diversos centros de pesquisas e o Parque Tecnológico da UFRJ.
— A ANP poderá usar esses recursos para promover o desenvolvimento regional, ou seja, pode decidir investir em um laboratório no Acre? Além disso, prevê escolher em qual fornecedor de equipamentos se investirá? Terá que ser de pequeno e médio porte? — indagou o empresário.
‘REGULAMENTAÇÃO COM IMPACTO NEGATIVO’
Para o diretor-executivo do Parque Tecnológico, Maurício Guedes, as mudanças em análise trazem uma elevada intervenção em recursos que não são públicos. O parque reúne 50 empresas. De 2006 a 2015, a parcela de recursos definida pelas empresas e destinada à pesquisa somou R$ 4,46 bilhões. Deste total, 28%, ou cerca de R$ 1,25 bilhão, foram para o Estado do Rio.
— A minuta em discussão (com as mudanças) traz para a ANP um poder muito maior de influência nesses recursos que vão para as universidades, desobrigando, de certa forma, as empresas de buscar essas parcerias — disse Guedes.
O secretário-executivo do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), que representa as petrolíferas, Antônio Guimarães, se mostrou cauteloso em relação ao assunto. Mas deixou claro que os empresários estão preocupados:
— O IBP acredita que os recursos em P&D são mais bem aplicados e geram melhores resultados quando geridos pelas empresas e devem continuar assim. Por isso, é assunto que nos preocupa. Queremos criar uma agenda positiva para criar atratividade para o setor. É uma regulamentação que teria impacto negativo, reduzindo a atratividade dos investimentos.
Para fazer essas análises da aplicação dos recursos, será criado um comitê com oito representantes, dos quais cinco serão da ANP, um das empresas petrolíferas, um das empresas fornecedores e um de instituições de pesquisa.
O diretor de Tecnologia e Inovação da Coppe/UFRJ, Romildo Toledo, também se mostrou cauteloso por não saber exatamente qual será o nível de ingerência da ANP.
— Os recursos que vão para os centros de pesquisa não mudarão, e são as empresas que escolherão em quais (vão investir). O que muda é que isso terá que ser aprovado por um comitê. A preocupação que existe é qual será a ingerência desse comitê — disse o professor Toledo.
A ANP afirmou, em nota, que seu objetivo é o aprimoramento das regras para aplicação dos recursos em P,D&I prevista nos contratos para exploração, desenvolvimento e produção de petróleo “de forma a criar ambiente mais propício à geração de inovação no país”.