No Dia Nacional de Combate ao Racismo, entrevistamos duas estudantes que desenvolvem pesquisas inovadoras em uma das maiores universidades do país.
Para além de trazer a pauta pra discussão, buscamos evidenciar cada vez mais o potencial que a pluralidade de experiências e a inclusão desempenham no campo científico e tecnológico.
Confira as entrevistas na íntegra:
Alessandra Pessoa de Vasconcellos tem 37 anos, faz bacharelado em Educação Física e é árbitra de canoagem pela Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa). Ingressou na EEFD/UFRJ em 2020.2.
Em qual ano você começou a se dedicar à pesquisa acadêmica?
Entre 2022 e 2024, fui bolsista CNPq no Laboratório de Neurociência do Exercício (LaNEx), localizado na Praia Vermelha | IPUB/UFRJ, onde participei ativamente do desenvolvimento da pesquisa UNILIFE-M. Este estudo investiga a relação entre saúde mental e estilo de vida dos universitários, com foco nos transtornos mentais e as possíveis modificações relativas as vivências no ambiente universitário. Durante minha trajetória no LaNEx, tive a oportunidade de colaborar com uma equipe multidisciplinar, adquirindo experiência em coleta e análise de dados, além de aprofundar meus conhecimentos sobre os impactos do exercício físico na saúde mental.
Faz parte de algum laboratório de pesquisa da UFRJ??
De 2022 a setembro de 2024, participei do Laboratório de Neurociência do Exercício (LaNEx) no IPUB/UFRJ, como bolsista do CNPq. Atualmente, integro o Grupo de Estudo em Esportes Paralímpicos (GEEP), onde continuo a aprofundar meus conhecimentos no campo da neurociência aplicada ao esporte, com foco na melhora do desempenho esportivo de atletas paralímpicos.
Resuma brevemente sobre o que se trata a sua pesquisa acadêmica.?
A paracanoagem é um esporte para pessoas com deficiência física, focado na velocidade e nas tarefas cognitivas, e estreou como modalidade paralímpica em 2016. As competições acontecem em provas de 200 metros, com categorias para caiaque (KL1, KL2, KL3) e canoa havaiana (VL1, VL2, VL3), que variam de acordo com o nível de funcionalidade dos paratletas. A plasticidade cortical nos paratletas, influenciada pelas lesões, é um fator importante na adaptação ao esporte. Um aspecto interessante que venho estudando é a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC), uma tecnologia inovadora que abarca uma técnica de neuromodulação não invasiva e indolor, que tem sido usada para melhorar o desempenho físico, resistência e força em atletas. No entanto, seus efeitos nos paratletas ainda são pouco explorados. Pesquisas indicam que a ETCC pode melhorar a percepção de fadiga e o controle emocional, fatores essenciais para o desempenho esportivo, além de influenciar o controle cardiovascular. Isso é especialmente relevante para paratletas, que podem ter alterações no controle da frequência cardíaca. Neste contexto, o meu grupo de estudo busca avaliar os efeitos da ETCC no desempenho físico, cognitivo e cardiovascular de paratletas durante um teste de contrarrelógio de 200 metros, com o objetivo de entender melhor como essa técnica pode beneficiar a performance e a saúde dos atletas.
Quais são os principais desafios enfrentados por jovens negros ao ingressarem na pesquisa acadêmica, especialmente em áreas inovadoras?
Os desafios socioeconômicos continuam a ser barreiras significativas para a ocupação de espaços acadêmicos em áreas como pesquisa, inovação/tecnologia e cultura corporal do movimento humano, especialmente para estudantes de contextos periféricos e de minorias raciais, como eu. A falta de recursos financeiros e a desigualdade educacional dificultam muito o acesso a essas áreas, e, por isso, as bolsas de pesquisa se tornam essenciais para promover a equidade. Eu senti na pele como a capacitação em línguas estrangeiras também pode ser uma grande barreira, limitando o acesso à literatura científica e às oportunidades de colaboração internacional, como a apresentação de trabalhos em congressos. No contexto universitário, nós, estudantes negras e periféricas, enfrentamos desafios adicionais, como o racismo estrutural e a falta de políticas inclusivas, o que torna nossa ascensão acadêmica ainda mais difícil. Esses obstáculos exigem uma reflexão profunda sobre as desigualdades no acesso ao conhecimento e uma mudança nas políticas para criar espaços acadêmicos verdadeiramente inclusivos e antirracistas. É fundamental garantir que todos os estudantes, independentemente de sua origem, tenham as mesmas oportunidades de contribuir para o avanço do conhecimento e para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa.
Como a presença de jovens negros na pesquisa pode contribuir para uma ciência mais inclusiva e relevante para a sociedade?
A presença desafiadora dos estudantes negros na ciência desempenha, para mim, um papel fundamental na humanização dos programas acadêmicos, trazendo uma visão mais inclusiva e diversificada. Sinto que minha contribuição e a de outras estudantes negras ampliam as discussões científicas, especialmente ao incorporar perspectivas interseccionais e de atravessamentos marcados no experenciar da vivência negra em um país racista. Essa troca de experiências enriquece o desenvolvimento e a aplicação de inovações tecnológicas, tornando-as mais completas e representativas no sentido da sankofa para as diversas realidades sociais.
Como você enxerga o impacto a longo prazo da diversidade racial na inovação e no avanço científico?
Acredito que minha participação ativa na ciência é essencial para garantir que as inovações sejam desenvolvidas de forma mais equitativa e horizontal, refletindo as realidades e necessidades de diferentes grupos sociais. Como uma pessoa negra inserida nesse campo, vejo minha presença como uma contribuição importante para ampliar as discussões acadêmicas, trazendo perspectivas que consideram as interseccionalidades e os atravessamentos poli culturais. Para mim, a presença negra na ciência não só promove a justiça social, mas também aprimora a capacidade da ciência de gerar soluções mais justas e acessíveis para todos. Essa diversidade de experiências e vivências torna a ciência mais rica e capaz de atender de maneira mais eficaz às demandas da sociedade como um todo.
Maria Eduarda Caldeira de Sousa Braz tem 20 anos, faz Fisioterapia e ingressou na UFRJ em 2023.1.
Em qual ano você começou a se dedicar à pesquisa acadêmica?
Em 2024.1, iniciei tanto no Grupo de Estudo em Esportes Paralímpicos (GEEP), quanto no Laboratório de Neuro Reparo (LNR). O primeiro focado em desenvolver o conhecimento mais prático e funcional da neuroestimulação aplicada no esporte visando a melhora do desempenho de atletas paralímpicos, enquanto o segundo está mais relacionado com estudos de análise funcional da recuperação do tecido nervoso e ao reconhecimento da parte histológica.
Faz parte de algum laboratório de pesquisa da UFRJ?
Sim, do Laboratório de Neuro Reparo (LNR), localizado no 4º andar do HUCFF.
Resuma brevemente sobre o que se trata a sua pesquisa acadêmica.
A paracanoagem é um esporte para pessoas com deficiência física, focado na velocidade e nas tarefas cognitivas, e estreou como modalidade paralímpica em 2016. As competições acontecem em provas de 200 metros, com categorias para caiaque (KL1, KL2, KL3) e canoa havaiana (VL1, VL2, VL3), que variam de acordo com o nível de funcionalidade dos paratletas. A plasticidade cortical nos paratletas, influenciada pelas lesões, é um fator importante na adaptação ao esporte. Um aspecto interessante que venho estudando é a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC), uma tecnologia inovadora que abarca uma técnica de neuromodulação não invasiva e indolor, que tem sido usada para melhorar o desempenho físico, resistência e força em atletas. No entanto, seus efeitos nos paratletas ainda são pouco explorados. Pesquisas indicam que a ETCC pode melhorar a percepção de fadiga e o controle emocional, fatores essenciais para o desempenho esportivo, além de influenciar o controle cardiovascular. Isso é especialmente relevante para paratletas, que podem ter alterações no controle da frequência cardíaca. Neste contexto, o meu grupo de estudo busca avaliar os efeitos da ETCC no desempenho físico, cognitivo e cardiovascular de paratletas durante um teste de contrarrelógio de 200 metros, com o objetivo de entender melhor como essa técnica pode beneficiar a performance e a saúde dos atletas.
Quais são os principais desafios enfrentados por jovens negros ao ingressarem na pesquisa acadêmica, especialmente em áreas inovadoras?
O maior desafio, sem dúvida, é a barreira socioeconômica que atravessa os estudantes diretamente com a incerteza se seremos capazes de nos manter dentro do espaço acadêmico, sendo peça fundamental em pesquisas e trazendo a inovação. O deslocamento exaustivo, o difícil acesso à políticas inclusivas que verdadeiramente assegurem a presença desses alunos, barreiras educacionais, são alguns fatores que desgastam aos poucos o estudante que luta para se manter na universidade, porque enxerga nela uma forma de mudança para a sua vida e dos seus. Nesses contextos, bolsas e incentivos se tornam fundamentais para manter o físico, mas também o emocional, porque é também no reconhecimento que se percebe que todo o esforço e o trabalho de excelência entregue, apesar de tudo te puxar para trás, vale a pena. Já chegamos no espaço acadêmico sabendo que temos de ser muito mais os outros, nossa entrega não pode ser mediana e isso é exaustivo, então as pequenas conquistas, os pequenos reconhecimentos, são pequenos reconfortos que nos motivam a seguir um pouco mais e a abrir espaços para outros como nós.
Como a presença de jovens negros na pesquisa pode contribuir para uma ciência mais inclusiva e relevante para a sociedade?
Eu pesquiso, estudo e me vejo como uma futura profissional da saúde de qualidade porque vejo pessoas negras fazendo e me mostrando que é possível. A presença de jovens negros no espaço acadêmico mostra para a comunidade que é possível sim chegar a um espaço que para muitos é distante e inatingível, é permitir que o sonho de mudar de vida, de ser agente de transformação se mantenha vivo, é reconfortante saber que eu não estou sozinha em busca disso e que o meu trabalho irá permitir que muitos outros acessem o mesmo e, se tudo der certo, de uma forma mais fácil. Além disso, não tem como pensar sobre uma comunidade e desenvolver conhecimento se não têm pessoas que fazem parte dela no time de quem pesquisa. Somos nós que podemos trazer as dores e os questionamentos da forma mais genuína e assim contribuir para desenvolver uma discussão mais equitativa e que de fato abrace todas as pessoas. É na pluralidade das experiências que mora a ciência verdadeiramente inclusiva e capaz de ser a solução para todos.
Como você enxerga o impacto a longo prazo da diversidade racial na inovação e no avanço científico?
Eu observo a construção de uma ciência mais inclusiva e justa, com pessoas que de fato representam a comunidade construindo e debatendo o “fazer ciência” de modo que essa ação olhe efetivamente para todos e atenda a necessidade daqueles que de certa forma sempre foram invisibilizados. Acredito que nós, ao estarmos nesses espaços, agregamos com perspectivas diferentes capazes de desenvolver soluções assertivas e acessíveis
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