Fonte: O Globo |
por Mauricio Guedes*
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) iniciou o processo de consulta pública para a mudança do regulamento que orienta os investimentos obrigatórios das empresas produtoras de petróleo em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Esta obrigação vai gerar nos próximos dez anos um investimento de mais de R$ 30 bilhões, um volume recorde de recursos para a promoção da inovação tecnológica em um setor no Brasil.
Um comitê controlado pela ANP determinará a relação de áreas prioritárias, projetos de interesse e temas relevantes para a indústria. O problema é que estes recursos pertencem às próprias empresas produtoras de petróleo, que assumiram o compromisso, diante do governo e dos seus acionistas, de aplicá-los bem. Não devem ser tratados como verba do Tesouro, correndo o risco de ter o mesmo fim dos fundos setoriais para a ciência e tecnologia, que são sistematicamente contingenciados para alimentar o superávit primário.
Não é com a tutela do Estado que levaremos as empresas brasileiras a investirem mais em inovação. Segundo o IBGE, em 2011 os gastos em pesquisa e desenvolvimento das empresas brasileiras corresponderam a 0,59 % do PIB. Na Zona do Euro, foram de 1,34%; e na China, de 1,39%. Para mudar estes números, o empresário brasileiro precisa enxergar os reais benefícios destas aplicações, e não delegar ao Estado a decisão sobre os investimentos a serem feitos.
Outro equívoco da proposta está na questão da descentralização das atividades de pesquisa e desenvolvimento. É utópica a aplicação equitativa dos recursos nas diferentes unidades da Federação. A realidade brasileira se impõe: entre 2006 e 2013, a destinação dos recursos foi decidida com racionalidade pelas empresas, com base na identificação das competências locais. Dos R$ 3,4 bilhões aplicados em instituições de pesquisas, 51% se destinaram aos estados do Rio de Janeiro (37%) e de São Paulo (14%). Não há como reverter este quadro por um decreto. O fato é que somos muito carentes de pesquisadores. Segundo dados do Banco Mundial, enquanto a Noruega tem 5.500 pesquisadores para cada 1 milhão de habitantes, no Brasil são apenas 710.
Ainda assim, a riqueza do pré-sal nos traz uma grande oportunidade. Em 2020 o Brasil será responsável por mais da metade da produção de petróleo em águas profundas em todo o mundo. Não basta uma política de conteúdo local voltada para atender o mercado interno.
Por que não permitir que parte desses recursos seja aplicada na internacionalização de pequenas empresas de base tecnológica, no fortalecimento das atividades de transferência de tecnologia de nossas universidades, em suas agências de inovação, em incubadoras de empresas e parques tecnológicos? Por que não incentivar os investimentos em fundos de capital de risco e acelerar o crescimento de nossas start-ups?
É bom lembrar que a obrigação de investimentos não é só para a pesquisa, mas também para a inovação.
*Mauricio Guedes é diretor do Parque Tecnológico da UFRJ